Mesmo condenado e em prisão domiciliar, líder continuava a comandar esquema que fabricava armas de guerra sob fachada de empresa de peças aeronáuticas; Justiça bloqueia R$ 40 milhões dos envolvidos.
A Polícia Federal deflagrou nesta quarta-feira (15) a Operação Forja, uma ofensiva que expôs o poder de adaptação do crime organizado brasileiro. O alvo é uma rede especializada na fabricação e no comércio ilegal de fuzis de uso restrito, cuja capacidade de produção — segundo os investigadores — chegava a 3.500 armas por ano, o suficiente para abastecer as principais facções do Rio de Janeiro.
A ação foi conduzida em parceria com o Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (GAECO/MPF) e teve o apoio da Polícia Militar de São Paulo. Ao todo, cerca de 50 agentes federais cumpriram 10 mandados de prisão preventiva e 8 de busca e apreensão nos estados do Rio de Janeiro, São Paulo e Minas Gerais. A Justiça Federal também determinou o bloqueio de R$ 40 milhões em bens e valores dos investigados.
A operação é um desdobramento da "Wardogs", deflagrada em 2023, quando o líder do grupo foi preso em flagrante com 47 fuzis e uma fábrica clandestina desmontada em Belo Horizonte (MG). Mesmo após ser condenado a 12 anos de prisão e colocado em prisão domiciliar, o homem voltou a reorganizar o esquema, transferindo a linha de produção para o interior de São Paulo.
A nova instalação funcionava sob a fachada de uma empresa de peças aeronáuticas, em Santa Bárbara d’Oeste (SP), e operava com máquinas industriais de alta precisão (CNC) — as mesmas usadas por indústrias de tecnologia avançada. Durante as buscas, a PF apreendeu fuzis prontos e mais de 31 mil peças e componentes, suficientes para a montagem de dezenas de armas.
De acordo com as investigações, o grupo também importava partes e componentes dos Estados Unidos e da China, utilizando um esquema de triangulação e ocultação de origem. As armas eram destinadas principalmente a facções do Rio de Janeiro, com entregas direcionadas para o Complexo do Alemão e a Rocinha.
O modelo de funcionamento da quadrilha se assemelhava ao de uma indústria formal: divisão de tarefas, técnicos especializados em metalurgia e engenheiros mecânicos, estrutura de logística e até um sistema contábil informal para administrar lucros e custos operacionais.
A PF acredita que a produção em escala industrial e o uso de tecnologia de ponta representam uma mudança de patamar na criminalidade armada, substituindo o antigo contrabando por um modelo de fabricação nacional de fuzis, mais difícil de rastrear.
Os investigados responderão pelos crimes de organização criminosa majorada, tráfico internacional e comércio ilegal de armas de fogo de uso restrito.
A operação faz parte da Missão Redentor, iniciativa permanente da Polícia Federal voltada à desarticulação de grupos armados que atuam no Rio de Janeiro, em conformidade com as diretrizes do Supremo Tribunal Federal (ADPF 635).
O nome “Forja” faz alusão direta à atividade central do grupo: a fabricação clandestina de armamentos — uma metáfora, segundo investigadores, para o poder de reconstrução e reinvenção do crime, que segue se moldando às brechas deixadas pelo Estado.