09/05/2025 às 14h50min - Atualizada em 09/05/2025 às 14h50min

O último capítulo, mas o mais valioso

Dr. Fernando Nader

Dr. Fernando Nader

Fernando Nader é médico, que tem entre suas formações, geriatria e neurologia.

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A terceira idade é uma fase da vida que muitos encaram como uma conquista, mas poucos compreendem como um desafio. É o tempo em que o corpo fala mais alto, e a memória se torna um espelho embaçado. Mas o que poucos percebem é que, para muitos idosos, o maior peso não está nas dores do corpo, mas nas perdas constantes ao redor.

 

Imagine passar uma vida ao lado de pessoas que você ama… amigos, irmãos, amores, todos compartilhando histórias, risadas e memórias. E então, aos poucos, essas vozes começam a se calar. Um a um, aqueles que fizeram parte da sua história partem. O vazio que fica não é apenas de quem se foi, mas de quem fica para lembrar.

 

Mas não é só isso. O idoso não apenas sente a ausência de quem partiu; ele sente o peso de uma contagem regressiva invisível. Em cada despedida, uma pergunta silenciosa: "Serei eu o próximo?". E, ainda assim, a vida continua, o coração bate, o dia amanhece… mas o medo do desconhecido se mistura com a saudade do que já não é.

 

Além das perdas, o envelhecimento também traz o desafio da solidão. A família cresce, os filhos seguem suas próprias vidas, e muitas vezes o idoso se vê como um espectador da própria existência. Em alguns casos, o que deveria ser uma fase de descanso se transforma em um fardo, onde netos, sobrinhos e até os próprios filhos despejam problemas, esquecendo que aquele que envelheceu também carrega suas próprias batalhas.

Mas o que falta entender é que a terceira idade não é um fardo. É uma fase que merece respeito, cuidado e, acima de tudo, honra. Porque aqueles que envelhecem são os que sobreviveram. São os que carregam histórias, segredos e lições que só o tempo pode ensinar.

Eu luto para que compreendam isso. Luto para que a sociedade enxergue a beleza que há na experiência, o valor que existe nas rugas, o tesouro que se encontra em cada palavra de quem viveu. E, acima de tudo, luto para que compreendam que a terceira idade não é apenas o final de uma jornada… mas o capítulo mais corajoso de uma vida.

 

E a chave para viver bem essa fase é simples, mas poderosa: viver o momento. Não se prender ao passado, não se angustiar com o futuro. Porque é no agora que a vida acontece. É no sorriso de hoje, na conversa sincera, no abraço verdadeiro que a felicidade se revela. Ser feliz na terceira idade é permitir-se sentir, é olhar o pôr do sol e agradecer, é rir mesmo que o corpo já não acompanhe o ritmo dos sonhos.

 

É entender que o tempo que passou foi precioso, mas o que realmente importa é o que ainda está aqui. É aceitar que a memória pode falhar, mas o amor que foi dado e recebido permanece. É saber que, mesmo com todas as despedidas, ainda há espaço para novas histórias. Porque enquanto há vida, há chance de recomeçar, de sorrir, de viver.

 

E sabemos que o tempo não para, e que a morte é inevitável. Então, que ela chegue com o sentimento de que o dever foi cumprido, que a missão acabou e que a vida foi vivida plenamente. Que cada instante tenha valido a pena, que cada riso tenha sido sincero e que cada abraço tenha deixado uma marca de amor.

 

Que as pessoas compreendam: os idosos que hoje caminham devagar foram aqueles que um dia correram para proteger. Suas mãos trêmulas já foram firmes para amparar, e seus olhos cansados já brilharam com sonhos e esperanças. Valorizem cada história contada, cada conselho dado. Porque um dia, todos olharão para trás, buscando alguém que escute, que ame, que respeite. E a forma como cuidam deles hoje é o reflexo do que colherão amanhã.

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