01/04/2025 às 08h04min - Atualizada em 01/04/2025 às 08h04min

Farmácia é farmácia. Consultório é consultório. E receita não é palpite

Dr. Fernando Nader

Dr. Fernando Nader

Fernando Nader é médico, que tem entre suas formações, geriatria e neurologia.

Reprodução

Mais uma semana, mais uma pauta que parece saída de um roteiro de ficção: farmacêuticos querendo prescrever medicamentos, inclusive os que exigem receita. A justificativa? “Ampliar o acesso à saúde”. O nome disso? Confusão institucional disfarçada de boa intenção.

 

Antes de tudo, que fique claro: o farmacêutico é um profissional valioso. Ele orienta, acompanha, esclarece. Ele soma. Mas existe uma linha — e ela se chama diagnóstico. E diagnóstico, meus caros, não se faz com conversa de balcão.

 

Prescrever não é só escrever o nome do remédio com letra feia. Prescrever é um ato clínico, baseado em conhecimento médico, análise criteriosa e responsabilidade legal. Não é escolha de prateleira. Não é “acho que isso vai te fazer bem”. Prescrição é decisão. E decisão que impacta vidas exige preparo — não boa vontade.

 

É preciso ter coragem para cuidar, mas muito mais preparo para indicar um caminho. Porque o remédio certo no momento errado vira veneno. E o que começa com uma febre simples pode terminar numa complicação grave, se for tratado com base em suposição e não em avaliação médica.

 

A Justiça fez o que precisava ser feito: colocou limite. Porque a saúde do paciente não pode ser palco de disputa de atribuições. Nem laboratório de boas intenções.

 

E enquanto isso… o que mais acontece? Os medicamentos sobem de preço.

 

Com reajuste de até 5,06%, o brasileiro agora precisa de receituário e financiamento. Tem gente parcelando a farmácia. O problema não é só acesso — é custo, é estrutura, é uma engrenagem pública travada onde falta tudo, menos o improviso.

 

Aí, na tentativa de resolver com “agilidade” aquilo que só se resolve com seriedade, querem transformar a farmácia no novo pronto-socorro da esquina. Uma “consulta relâmpago” entre o caixa e o expositor de protetor solar. E ainda chamam isso de avanço.

 

Avanço é ter médico atendendo com estrutura. Avanço é o farmacêutico sendo respeitado no seu papel. Avanço é o paciente sendo acolhido, não empurrado de balcão em balcão até achar alguém que se arrisque a “dar um remedinho”.

 

Porque no fim, não é sobre território profissional, é sobre responsabilidade.

Quem prescreve, responde.

Quem diagnostica, trata.

Quem vive disso, sabe o peso que carrega.

 

O médico não é mais importante. É só o que foi preparado pra isso.

 

E preparação, nesse caso, não se improvisa.

 

O farmacêutico tem seu lugar — essencial, técnico, indispensável. Mas consulta não é cortesia. É compromisso. E prescrição, doutores, continua sendo coisa séria.

 

Aos que confundem boa intenção com competência clínica, um recado com carinho e uma pitada de acidez:

pra cuidar de vidas, não basta querer. Tem que saber.

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